sexta-feira, 18 de maio de 2018

Os museus ‘hiperconectados’

Ana Silvia Bloise, museóloga
Desde o início da minha vida profissional acompanho a criação e trajetória de museus de pequeno porte. O diferencial desses museus se dá em primeiro lugar pela sua inserção social, não tanto pela quantidade ou qualidade de objetos do acervo. Tal constatação me leva a crer que bons museus são museus úteis aos seus diferentes públicos. 

Quais seriam esses diferentes públicos, em primeiro lugar?
Amigos dos museus,
Estudantes universitários,
Famílias - em busca de lazer e/ou oportunidade para educação dos seus filhos,
Formadores de opinião,
Jornalistas,
Grupos de estudantes do ensino básico e regular,
Grupos de turistas (turismo da natureza, turismo regional, religioso, internacional, de negócios e eventos),
Pesquisadores – para pesquisas de TCC, mestrado, doutorado, artigos acadêmicos.

Por fim, pessoas que já recebem alguma forma de atendimento na comunidade: idosos, deficientes, abrigados, imigrantes, em tratamento médico ou psicológico, etc.
Penso que os museus de caráter local ou regional devam se preocupar em tecer um relacionamento com seus públicos. E transformar uma lista de públicos-alvo, como esta que indiquei, em rostos, nomes e endereços, buscando estabelecer com cada um deles um relacionamento efetivo, parcerias de longa duração, que resultem em trocas.

Conexão não é sinônimo de comunicação. Conexão é o caminho da comunicação, sem o caminho a comunicação não se estabelece, e esta troca não acontece. Comunicação é via de mão dupla, exige o ir e vir da informação, do conteúdo, dos saberes. Se o Museu não tem a humildade de se predispor a conhecer a realidade fora de seus muros e paredes, ele não está conectado, estará falando sozinho e não terá sua utilidade social evidenciada.

Museus desconectados de seus públicos são museus sem função social, depósitos de objetos e de pessoas - mesmo quando realizam ações nas redes sociais, por exemplo. O que são tweets diários de museu sem curtidas, sem comentários e sem retransmissão? Exemplo negativo de hiperconexão, do tipo que não estabelece comunicação: Só servem para cumprir metas quantitativas.

Penso que o primeiro dever do pequeno Museu é olhar e cuidar do seu jardim, para depois avançar para cuidar também da praça, do parque, mais tarde da cidade e, (por que não?) alcançar uma projeção no mundo.

Olhe primeiro para quem vive ao seu lado, para aqueles que passam na frente da porta do Museu, e que nem sabem o que lá dentro existe. Nós, profissionais de museus, sabemos o quanto os museus podem ser interessantes, inovadores e estimulantes, e eles não tiveram a oportunidade de experimentar ainda.

Acervo online é para quem pode, não é para quem quer. A realidade é que a maioria dos pequenos museus não tem conhecimento suficientemente consolidado para expor seu acervo em exposição ou em reservas técnicas. Tour virtual em museu? Talvez seja outra ilusão recorrente da hiperconexão. Para que servirá mostrar um edifício, salas, vitrines e paredes, acompanhados de histórias e discursos que não trarão público e, na maior parte das vezes, pouco esclarecem?

Portanto, cuidado! Está na hora de analisar, de maneira mais crítica e profunda, sua política de comunicação e desconstruir aquela ideia de que o bom Museu obrigatoriamente tem que estar no Facebook, no Instagram, no Twitter, no site, no portal, no celular...

No entanto, se o Museu tem uma equipe profissional, capacitada e atualizada, animada e, principalmente, comprometida com o trabalho em função do(s) público(s), então pode ousar se abrir para a hiperconexão e seguramente irá ampliar seus horizontes!

Ana Silvia Bloise
Museóloga

(*) Artigo publicado originalmente na Revista Museu